sexta-feira, 20 de julho de 2012

Matéria publicada na Revista acontece Vale: Multiplicando Ações Inclusivas: a escola e o aluno com deficiência visual

 

 

 

Multiplicando Ações Inclusivas: a escola e o  aluno com deficiência visual

           

 

 

Luciane Molina *

 

Enquanto buscamos compreender os mecanismos pelos quais ocorrem o aprendizado e o desenvolvimento das pessoas com deficiência visual,  escolas e professores continuam negando-lhes matrícula, justificada pelo despreparo em lidar com tais características.

 

Muito embora a deficiência visual exija certo conhecimento sobre a aquisição de conceitos por meio de esquemas não visuais, trabalhar com esse aluno demanda, em primeiro lugar, a compreensão de que sua essência é a de ser "criança" independente de qualquer limitação física ou sensorial. Afinal a inclusão não significa tratar todos como se fossem iguais, mas sim respeitar a diversidade de cada ser humano.

 

A partir da crescente demanda pelas salas de recursos multifuncionais, adotadas pela política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva do Ministério da Educação (MEC/SECADI), o serviço do Atendimento Educacional Especializado (AEE) passou a ser oferecido aos alunos com deficiência, transtorno global do desenvolvimento e altas habilidades no contra turno do ensino regular, em espaços com recursos e métodos específicos, através do acompanhamento por professores especialistas.

 

No caso do aluno com deficiência visual ( cegueira ou baixa visão), o especialista organiza um plano de ação que contemple o ensino do método Braille, da orientação e mobilidade, do soroban, uso de recursos ópticos para ampliação de letras, softwares, estimulação sensorial, treinamento da visão residual, dentre outros. Esse atendimento não poderá substituir o ensino regular ou conteúdos pertinentes a sala comum. Na sala de recursos ele irá desenvolver habilidades específicas e esquemas mentais que possibilite sua permanência na escola regular.

 

No plano de ação, o especialista  deve considerar as informações e avaliação geral do aluno: identificação, dados familiares, condição de saúde, deficiência e necessidades educacionais especiais. Os fatores pedagógicos contemplarão: percepção, atenção, memória, linguagem, raciocínio lógico, desenvolvimento e capacidade motora, área emocional, afetiva e interação.

 

Vimos  que o trabalho em sala de recursos acontece paralelamente ao ensino regular, isso porque  a matrícula nessa última é requisito obrigatório para que o aluno receba o AEE no contra turno.

 

 

Você tem um aluno de "inclusão" em sua classe?

Não existe o aluno de "inclusão". Se aprendemos por meios diferentes e a classe é heterogênea, se as pessoas não são iguais umas das outras conforme o princípio da diversidade, se a escola é um ambiente de convívios e construções coletivas, não existe um aluno de "inclusão", mas sim diferentes alunos que participam do processo de inclusão. Por isso, rotular, julgar ou identificar uma criança por meio de suas características só evidencia as limitações e potencializa suas fraquezas. Evite generalizar aspectos positivos ou negativos sobre a cegueira e incentive seu aluno a buscar estratégias e meios para superar sua dificuldade.

 

Comunicação

Comunique-se da maneira mais natural possível. Para quem possui dificuldades de enxergar,  Evite apontar pessoas ou  objetos, não fale alto e descreva as cenas relevantes, incluindo disposição do ambiente e mobiliários. Ao tratar de cores, faça associação com objetos ou sensações, como branco do algodão, verde das folhas, vermelho do fogo/quente, entre outras percepções relevantes e significativas para cada um. Essa percepção poderá variar de pessoa para pessoa. Ao aproximar-se de uma criança com deficiência visual, identifique-se, tocando-a levemente nos braços ou ombros para que compreenda que está falando com ela e anuncie quando afastar-se. Substitua palavras como "isso", "aquilo", "ali", "lá", sendo o mais objetivo possível, nomeando objetos, pessoas, indicando lateralidade ou distâncias com alguma precisão em metros ou passos.

 

Sala de aula

Será indispensável a apresentação da criança cega aos demais da turma e vice-versa. A criança com deficiência visual poderá demorar algum tempo para conseguir reconhecer todos  os colegas através do timbre de voz, por isso, identifique sempre  que necessário. Evite alterar com frequência a disposição das crianças em sala de aula e mantenha sempre o mobiliário organizado. Caminhe com o aluno cego para que ele reconheça todos os detalhes do espaço. O professor, orientará o aluno para que segure em seu cotovelo e permaneça meio passo atrás, para que  perceba o  movimento corporal e o acompanhe. Incentive-o a rastrear os objetos com o tato, posicionando suas mãos para explorá-los. Posteriormente refaça a caminhada orientando-o apenas verbalmente, e exercite as técnicas de audiodescrição, que significa descrever, com clareza e detalhes, tudo o que é visualmente relevante no ambiente. A audiodescrição poderá também  ser praticada ao explicar desenhos, gráficos, mapas, imagens ou enquanto escreve na lousa. Mantenha o ambiente organizado e converse com os demais alunos para que essa prática seja frequente. Procure incluir o aluno com deficiência visual em todas as atividades, adaptando-as. Sugiro também elaborar um esquema de cooperação, através do qual um amigo será nomeado para ajudá-lo durante o período. Apresente o código Braille para todos os demais alunos, certamente eles se interessarão em aprendê-lo e, de forma lúdica, este poderá constituir-se um elemento facilitador de aprendizagem.

 

Escola

Proponha dinâmicas para que todos os demais alunos da escola interaja com a criança com deficiência visual, porém, tome cuidado para que isso não coloque essa criança em posição de destaque com relação aos demais. Deixe que seja de forma espontânea e natural. Faça algumas adaptações no ambiente físico, como identificação de espaços com texturas ou sinalização Braille. Promova junto aos professores, pais e comunidade atividades de formação e informação a respeito da deficiência visual e reserve horários de estudo coletivo com os profissionais que atuam na instituição. Todos precisam participar do processo de escolarização da criança com deficiência, não sendo apenas responsabilidade individual de um único professor.

 

 

Luciane Molina é pedagoga e pessoa com deficiência visual. atua com educação inclusiva no município de Lorena.

Esse texto foi publicado na Revista Acontece Vale, de julho de 2012. Ano II, nº 15.

 

As imagens acima mostram as páginas 14 e 15 originais da revista junto da foto publicada. Rosto de Luciane em frente à fachada do Memorial da Inclusão, SP.

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