sábado, 2 de agosto de 2014

Reflexão sobre a Gravação com a TV Vanguarda

REFLEXÃO SOBRE A GRAVAÇÃO COM A TV VANGUARDA

Minha preocupação em comunicar e informar a sociedade sobre como incluir as pessoas com deficiência nas atividades comuns tem sido recorrente durante meus quase quatorze anos de profissão. Escolhi o magistério como forma de tentar reconstruir um cenário educacional devastado pela ausência de professores habilitados ou entusiasmados o suficiente para não deixarem os alunos com deficiência visual solitários em meio a multidão.

A inclusão não é um processo isolado e o conhecimento é a chave para o sucesso de qualquer ação que visa transformar incapacidades, enxergando as potencialidades de cada pessoa com ou sem deficiência. É fato que recursos e ferramentas, sobretudo a presença da tecnologia, trouxe novas perspectivas de aprendizagem e interação. Entretanto, muitos ainda desconhecem o básico sobre o universo que sustenta uma sociedade inclusiva.

É recorrente que a mídia, seja impressa ou falada, insista numa imagem "desfocada" da pessoa com deficiência visual. A tendência em perpetuar o sentimento do 'coitadismo" vem estampada em matérias com histórias de superação, marcadas pela dependência, pela incapacidade, pela pobreza e pelo sofrimento. E são essas as características que a maioria das pessoas associa Às deficiências, junto com ideias de caridade e de heroísmo atribuídos à pessoas comuns, apesar da ausência da visão.

As pautas surgem com tanta superficialidade que, na grande maioria, jornalistas empobrecem suas matérias porque temas desse gênero levam tempo para serem compreendidos e despertam pouco interesse para uma investigação mais aprofundada. Preservam a quantidade em detrimento da qualidade e assim a informação é transmitida sem qualquer suporte ou consultoria.

Fascinada pelo alcance da informação, como pedagoga eu também procuro ser uma comunicadora sobre inclusão. Pude experimentar, nessa semana, uma situação considerada inédita para mim. Fui entrevistada e participei da gravação de uma matéria para a tevê, na emissora que, talvez, seja considerada a mais poderosa do país. e quem não deseja ser global e entrar na casa das pessoas para levar um conhecimento desconhecido para muitos? Mesmo que seja em uma retransmissora regional, essa é, de longe, uma das maiores conquistas do segmento da pessoa com deficiência.

A matéria ainda não foi ao ar, entretanto o tema abordado foi o da capacitação de professores para atuarem com alunos cegos, num dos cursos que ministro no Vale do paraíba. Repórter e cinegrafista abriram a porta e o silêncio se fez presente apesar da câmera ainda desligada. Acredito que todos ali estávamos apreensivos. E eu lá, uma professora cega em meio a duas dezenas de professores videntes. Sempre digo que o processo inclusivo é construído numa via de mão dupla e, naquele momento o cenário era a inclusão dentro da própria inclusão.

Como faço questão de relatar por onde passo, são raros os momentos em que eu percebo não enxergar de verdade. Tudo ao meu redor acontece de uma forma tão natural e a ausência da visão não me atrapalha em quase nada do que faço. Ou pelo menos não percebo essa distância entre o ver e o não ver e, por isso, o impacto maior vem manifestado pelas pessoas que enxergam e que entram em contato com a minha realidade, uma realidade também de cerca de 6,5 milhões de pessoas no Brasil, segundo o censo IBGE 2010.

Não gosto de ensaio nem de tentar adivinhar as perguntas, formulando respostas imaginárias. Olhar em direção à câmera também não é um tabu. Falar nunca foi problema, aliás, falo demais da conta. Então o cenário estava pronto com a aula que transcorria normalmente. De repente me vi diante de um repórter e um cinegrafista interessadíssimos, que por mais que desconhecessem o tema da aula, que se tratava de matemática e soroban, mostravam-se tão naturais diante daquele ambiente repleto de intenções e práticas inclusivas. Nem mesmo as folhas em Braille foram motivo de estranhamento. Minha locomoção pela sala jamais foi vista como ato heroico e seu espanto ao me ver utilizando um celular foi engraçado, não como uma forma de superação apesar da deficiência, mas pela novidade que a tecnologia é capaz de proporcionar. Tudo isso acompanhado por um cinegrafista igualmente interessado e participativo.

Ministrei a aula, orientei alunos, concedi entrevista, assisti à gravação e conversamos, "falamos em Off. De repente me dei conta de quão interessante eram suas colocações sobre a deficiência, seu olhar e sua postura inclusiva. Perguntas construídas inteligentemente e a ideia de que não adianta colocar um aluno dentro da sala de aula se não oferecer-lhe ferramentas para seu aprendizado. O solitário na multidão me fez compreender que por trás daquela pauta havia um estudo, uma pesquisa ou, apenas a sensibilidade de um ser humano capaz de compreender a riqueza da diversidade, a importância da inclusão para uma sociedade que ainda engatinha, apesar dos passos tímidos e isolados. Um repórter que não ficou excluído daquele ambiente inclusivo porque soube adentrar num universo tão diferente e, ao mesmo tempo tão semelhante aos que convivo diariamente.

Ele conversou com as cursistas, que também me surpreenderam com as respostas tão coerentes com aquilo que tentei transmitir nesse um ano e meio de convivência. Acho que fui eu quem aprendeu muito mais sobre a arte da comunicação naqueles minutos de gravações. Senti-me aliviada ao ouvir em alto e bom som o termo "pessoa com deficiência". Confesso que estava apreensiva por um "portador de deficiência" ou "pessoas especiais". Fui saber que havia uma pesquisa por trás. E enquanto aguardo pela exibição da matéria, fico imaginando como o preconceito e a exclusão podem ser combatidos com atitudes tão leves e simples, comunicadas e levadas para dentro da casa das pessoas, para que a sociedade possa compreender o verdadeiro valor do respeito, da convivência e da cidadania.

Sou grata por momentos tão especiais. Sou grata por pessoas tão especiais cruzarem meu caminho para abrir caminho para tantas outras pessoas compreenderem a beleza e a singularidade da vida!

Obrigada ao Bruno e ao Cadu por tamanha sensibilidade e pela grandiosa aula!!

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