terça-feira, 29 de julho de 2014

Aprendizado do Braille é feito por Simbolismo

Apesar de não enxergarem, pessoas cegas desenvolvem esquemas perceptivos para interagirem com o mundo a sua volta. É através do tato que conseguem ler palavras e sentenças escritas no Sistema Braille, uma escrita em relevo criada através da combinação de 6 pontos dentro de um espaço retangular. Cada letra do sistema Braille ocupa um espaço aproximado de 3 mm de altura  por 2 mm de largura, que cabe exatamente na pontinha do dedo. A leitura é feita mediante leve pressão, com movimentos circulares no papel. A estimulação sensorial é uma das fases mais importantes ao iniciar o processo de alfabetização Braille, pois essa forma de escrita requer um bom domínio motor, cognitivo e tátil. Aprender Braille não é tarefa difícil, entretanto um dos fatores que dificulta o aprendizado está na maneira como se ensina ler e escrever sem contar com as pistas simbólicas visuais.
 
O professor que ensina Braille para um aluno cego precisa compreender que, mesmo sem pistas visuais, o simbolismo ocorre. a pessoa cega utiliza os outros sentidos para atribuir significado aos objetos, lugares e pessoas que fazem parte do seu cotidiano. São capazes de criarem imagens mentais através das descrições que ouvem, das formas e texturas que sentem, dos aromas que percebem ou dos sons do ambiente. Assim, cada pessoa possui um repertório de imagens, seja porque já enxergou  em algum momento da vida, seja porque criou através da associação simbólica pelos sentidos. Esse repertório jamais pode ser ignorado.
 
Entretanto, tenho percebido, com muita frequência, que os esquemas simbólicos estão sendo ignorados por muitos professores que ensinam Braille. Alunos cegos tem se afastado desse aprendizado porque acabam não conseguindo desempenho para a leitura e, quando  muito, conseguem escrever algumas poucas palavras. Assim que o vício do aprendizado sem sustentação simbólica é instalado, pouco se consegue fazer para reverter a situação, senão começar do zero.
 
Apenas para esclarecer, os seis pontos que quando combinados formam as letras, são enumerados e ocupam um espaço dentro do retângulo, milimetricamente distribuídos. Do lado esquerdo temos os pontos 1, 2 e 3, numa coluna vertical. Do lado direito, também na vertical, temos os pontos 4, 5 e 6. Embora esse retângulo, denominado "cela" Braille seja enumerado, o aprendizado do alfabeto não pode ser sustentado pela decoreba dos pontos. É isso que tem acontecido e que é de uma gravidade tremenda: o ensino do Braille tem ocorrido por decodificação, em que cada aluno é quase forçado a decorar quais os pontos que formam uma letra, como acontecia com as tabuadas.
 
Quando se lê, não lê-se pontos soltos, mas pontos combinados entre si, e que para o tato, forma um desenho, uma imagem, ou seja, são simbólicos. Quem lê Braille recorre ao seu repertório próprio de imagens para atribuir um significado, associar aquela forma a uma figura já conhecida pela memória. Quando se lê um arranjo de 3 pontos na vertical, do lado esquerdo, não lê-se pontos 1, 2 e 3, mas lê-se um formato. Portanto, a pontinha dos dedos passa, simultaneamente, pelo arranjo completo dos pontos, devolvendo a resposta como sendo a letra "l".
 
Saber a posição que cada ponto ocupa dentro da "cela" Braille é necessário, entretanto, partir da "decoreba" dos pontos para conseguir uma leitura precisa é, no mínimo, prática de professores amadores. Lemos desenhos, lemos imagens, lemos formas, aquelas que o tato interpreta e simboliza, que a mente associa e atribui um significado. Não lemos pontos decorados e isolados, não aprendemos assim ou corremos o risco de um aprendizado sem qualquer sustentação.
 
Luciane Molina
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

domingo, 27 de julho de 2014

Terceira aula do Curso de Braille em Ubatuba

A terceira aula do curso de Braille em Ubatuba aconteceu na última
sexta-feira (25) e teve como objetivo a escrita pontográfica utilizando
reglete e punção.

Até esse momento, algumas noções teóricas referentes a
alfabetização/reabilitação das pessoas cegas através do sistema Braille
foram apresentadas. Priorizei alguns detalhes que são necessários para o
bom domínio das técnicas e para que os professores consigam orientar,
com segurança, seus alunos. Alguns cursos que tenho visto Brasil afora,
tem como foco apenas uma escrita precisa e uma leitura com compreensão,
esquecendo-se de aspectos particulares, dos esquemas sensoriais, da
percepção imagética e do desenvolvimento simbólico e motor. entretanto
esse é o diferencial que procuro demonstrar nas aulas, por isso só dou
início à parte mais prática, depois das aulas expositivas e teóricas.

Passamos também pela etapa da transcrição, utilizando as matrizes da
primeira série de sinais. em seguida, fizemos uma reescrita de palavras,
juntando leitura e escrita em tinta. Nesse terceiro encontro chegou o
momento tão esperado por todos: o da escrita Braille com reglete e punção.

Cada cursista recebeu um reglete e um punção, cedidos em caráter de
empréstimo até o final do curso. Repassei, individualmente as noções de
reversibilidade, pois a escrita acontece da direita para a esquerda,
alterando a posição da "cela Braille. Com a compreensão de que o relevo
será produzido no verso do papel, é fácil entender a troca de
lateralidade, esquerda para direita, sendo que para a escrita os pontos
123 ficarão para a direita e os pontos 456 ficarão para a esquerda. é
questão de lógica e de processo de espelhamento, o que exige um certo
esforço para efetuar a reversibilidade.

Levei uma imagem para apoiar a explicação, entretanto não houve
dificuldade por parte dos cursistas, que já estavam menos "apavorados".
A atividade 03 consistiu no reconhecimento das mesmas matrizes da
primeira série de sinais, agora por meio da escrita e da cópia de 10
palavras da atividade 01.

A aula finalizou com a sensação de que agora, aquelas mais de duas
dezenas de professores já tinham despertado para a escrita, assim como
ocorrera para a transcrição e leitura e que, a partir de então, novas
descobertas estariam por vir. Apresentei a segunda série de sinais,
derivada da anterior e deixei como atividade para casa, a transcrição e
escrita das palavras da próxima atividade.

A aluna com deficiência visual, da rede regular de ensino, também
acompanhou as aulas e realizou algumas atividades, flexibilizadas para o
seu caso.

Retornamos no dia 07 de agosto, com mais novas e grandes descobertas!

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Textos do Guia Inclusivo

A comunicação é vista por mim como uma incrível arte, capaz de informar e levar mensagens tão necessárias à construção de uma sociedade inclusiva. Escrever sobre inclusão, pessoa com deficiência e acessibilidade passou a ser uma bandeira que levanto incansavelmente em direção a você, leitor, porque todos somos agentes multiplicadores de condutas e conceitos necessários a equiparação de direitos. Como colunista convidada do Guia Inclusivo <www.guiainclusivo.com.br> conduzo reflexões e debates, movimento histórias e reinvento diferentes formas de atingir o maior número de pessoas. Abaixo trago alguns dos artigos que já escrevi desde 2012. Mergulhe nesse conteúdo, leia, comente e dê-nos sua opinião. O retorno dos leitores é muito importante para a concretização de um trabalho em prol da informação e da transformação de realidades. Escolha um texto e deixe seu comentário aqui!
 
Quando sou Igual na Multidão
16 de julho de 2014
 
As tecnologias assistivas: comunicação além das imagens
07 de julho de 2014
 
Braille: das palavras invisíveis às histórias que se materializam no papel
07 de julho de 2014
 
O protagonismo da pessoa com deficiência em busca da audiodescrição
06 de junho de 2014
 
O QUE FALAR SOBRE INCLUSÃO SE O QUE PRECISAMOS É DE AÇÃO?
05 de maio de 2014
 
A formação de Professores ainda se mostra Insuficiente na Área da Pessoa com deficiência
05 de maio de 2014
 
Educação Inclusiva não é utopia: algumas dicas para professores
04 de abril de 2014
 
Três anos de Guia Inclusivo e uma Vida inteira pela Inclusão
02 de fevereiro de 2014
 
A "Inclusão" Além Daquilo Que Se Pode Ver
12 de dezembro de 2013
 
Posso ensinar cores a uma pessoa cega?
09 de setembro de 2013
 
A Fotografia como Fator de Inclusão da Pessoa com Deficiência Visual
06 de junho de 2013
 
Pessoas "acessíveis"
01 de janeiro de 2013
 
A Inclusão do Professor com Deficiência nas Escolas Brasileiras
05 de maio de 2013
 
Virada Inclusiva no SESC Taubaté
12 de dezembro de 2012
 
O paradoxo da inclusão
11 de novembro de 2012
 
Caminhada pela Inclusão
09 de setembro de 2012
 
A popularidade do Braille
07 de julho de 2012
 
Incluir depende de ação e informação
05 de maio de 2012
 
Vídeo audiodescrito
04 de abril de 2012
 
Pelo Direito à Educação
10 de outubro de 2012
 
Qwitter: um Twitter acessível
07 de julho de 2011
 
De Qual Inclusão Estamos Falando?
11 de novembro de 2013
 
O Acessível como Sinônimo de solidariedade
08 de agosto de 2013
 
Tecnologia e deficiência visual: uma reflexão a favor do progresso
10 de outubro de 2013
 
Dia Nacional do Braille é Comemorado em 8 de Abril
04 de abril de 2013
 
Braille nas Universidades: utopia ou realidade?
07 de julho de 2013
 
Baixa Visão: Algumas orientações para Professores
03 de março de 2013
 
Educação Inclusiva: uma Ruptura de Paradigma
02 de fevereiro de 2012
 
 

sábado, 12 de julho de 2014

Segunda Aula do Curso de Grafia Braille em Ubatuba

Segunda Aula do Curso de Braille em Ubatuba

No nosso segundo encontro, realizado nessa sexta-feira (11) demos
continuidade aos conceitos referentes ao uso do tato para o aprendizado
da leitura e da escrita Braille, técnicas referentes a estimulação
sensorial, fase preparatória e passamos pelos materiais indispensáveis à
produção de textos em Braille, apresentando uma breve demonstração do
uso de reglete e punção, pois esses instrumentos serão estudados com
maior profundidade mais tarde.

Além disso, algumas dicas de como facilitar a leitura e a escrita em
Braille foram repassadas a fim de que o professor compreenda todo o
processo de aquisição das habilidades sensoriais, cognitivas e motoras,
necessárias ao bom domínio da alfabetização e reabilitação pelo método
Braille.

E enquanto a aula se desenrolava, os materiais eram também apresentados
a uma nova companheira de turma, uma aluna da rede municipal de Ubatuba
que foi nos visitar no curso. Ela tem deficiência visual e havia se
afastado do Braille por falta de estímulo e agora, no oitavo ano
gostaria de retomar as atividades e foi conhecer como estávamos lidando
com esse assunto.

Também recebemos a visita da secretária de educação do município de
Ubatuba e da coordenadora de educação especial; ambas demonstraram
satisfação pelo empenho dos professores em estarem em busca de novos
conhecimentos e desejaram a todos um excelente curso.

Continuamos as atividades dedicando-nos a uma etapa que, talvez, seja a
mais importante do curso: a demonstração da primeira série de sinais do
alfabeto e sua composição, letra a letra, comparando semelhanças e
diferenças. Fizemos a decodificação numérica dos pontos e,
posteriormente, ensinei como a representação imagética surgiria como
associação a objetos, figuras e imagens representativas, que fazem parte
do repertório individual. Coletivamente fizemos algumas associações,
além de trazer a noção de reversibilidade ou espelho das letras.

Reforcei o aprendizado das dez primeiras letras acrescentando a noção de
símbolo simples e símbolo composto, este segundo baseado no sinal de
letra maiúscula e sinal de algarismo e aproveitei pra ensinar como as
letras do alfabeto simples podem ser grafadas em maiúsculo e, também,
como as mesmas letras podem se transformar em numerais mediante a
colocação de um sinal acessório que antecede o símbolo.

Algumas fichas de palavras prontas foram apresentadas por mim e a
leitura, quase silabada, começou a ser feita coletivamente, como se uns
ajudassem os outros a desvendarem peças de um quebra-cabeça. Esse é um
dos pontos mais relevantes da aula, cuja sensação de medo, angústia e
desespero se mesclam. Desespero quase sempre atenuado no ou desaparecido
até o final da aula, dando lugar a uma satisfação inexplicável de
conseguir aquilo que antes imaginavam impossível.

Enquanto liam as fichas, uma a uma apresentadas por mim, descobriram a
noção de espaço entre símbolos e encontraram a letra "É". Surpresos
trataram de esboçar um desânimo ao saberem que teriam que aprender novas
combinações, mas logo sentiram-se encantados ao saber que essa letra foi
aprendida antes mesmo da letra "a", pois a "cela" braille completa já se
transformara em amiga antiga e inseparável de quem deseja aprimorar o
aprendizado do código Braille. Toda e qualquer combinação depende,
exclusivamente, da "cela" braille como ponto de partida.

Para finalizar, iniciamos o processo de transcrição, cujos conceitos e
técnicas foram claramente explicados por mim e colocados em prática por
cada cursista ao realizarem a atividade número 1 da nossa apostila. a
atividade continha palavras já conhecidas das fichas de leitura e outras
novas. Consistiu na transcrição das mesmas na própria folha da apostila.
Conferimos oralmente e todos tiveram um excelente desempenho. Como
tarefa pedi que realizassem a atividade de número 2 e lessem o passo a
passo na apostila sobre como trabalhar a conceituação básica do alfabeto
através do alfabraille.

Foi mesmo uma aula muito produtiva. Obrigada pela participação e uma
estrelinha de parabéns a cada um que desempenhou com maestria e ousadia
a função de se transformarem em multiplicadores. Chegaremos lá!